Nos últimos tempos, os legisladores
deste país tentam agir como se donos fossem dos corpos das mulheres e pudessem
decidir, por elas, qual procedimento adotar por ocasião do nascimento de seus
filhos.
Espalham notícias de que a cesárea faz
mal à mulher e ao feto (falácia desmentida por inúmeros estudos e médicos) e
tentam impor o parto natural, como se ele também não pudesse trazer prejuízo à
mulher e ao feto (ruptura da musculatura uterina; bexiga caída; prolapso de
órgãos pélvicos; o bebê pode ser prejudicado durante um fórceps ou ter
sofrimento fetal – quando os médicos não percebem que o feto já está morrendo
de tanto esperar para nascer “naturalmente”).
Tomando por exemplo um país
desenvolvido, na Suíça as cesáreas representam 1/3 dos nascimentos e estão
aumentando. O médico diz que “a situação é um reflexo da nossa civilização, da
necessidade de segurança e controle, do desejo de planejar o trabalho e a vida
familiar e - por último, mas não menos importante - da independência das
mulheres. ‘Cesarianas seguras são possíveis graças aos avanços médicos e elas
são um conforto que estamos prontos a pagar’".
O governo suíço encomendou um estudo
para analisar a questão, mas acabou declarando em fevereiro que as causas e
efeitos não podem ser avaliadas de forma conclusiva por causa de interações
complexas.
(http://www.swissinfo.ch/por/obstetr%C3%ADcia_parteiras-su%C3%AD%C3%A7as-descontentes-com-cesarianas/35738202)
É certo que a OMS (Organização Mundial
da Saúde) em um congresso realizado em Fortaleza (sim, a palhaçada obviamente
veio daqui) chegou à conclusão (infundada) de que a taxa de cesárea deve
limitar-se a 15% da população (?!). Mas, a própria OMS admite que não há
estudos conclusivos sobre os benefícios de NÃO se realizar a cesárea. (http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/161442/3/WHO_RHR_15.02_por.pdf)
O engano ocorre quando se considera o
índice de mortalidade na cesárea, minimamente superior ao parto natural, sem
observar que em muitos casos de cesárea, os riscos de mortalidade são
pré-existentes, daí porque se optou pela cesárea, para tentar salvar mãe ou
bebê.
Por causa de interpretações mal
feitas, originadas no tal congresso, o Brasil (como autêntico país hipócrita e
mesquinho) tira vantagem para favorecer interesses obscuros.
A desconfiança de que o SUS quer
desonerar seu cofres, deixando de realizar cesáreas é indiscutível. Agora, além
do SUS, querem desonerar os planos médicos particulares, obrigando a uma “taxa
de cesária máxima” permitida no país.
A questão que se impõe é “tem o
Governo o direito de decidir como a mulher cuida do seu corpo?”
Ainda que se diga tratar-se não apenas
do corpo da mulher, mas da vida do feto, repito a pergunta: “tem o Governo o
direito de decidir como a mulher cuida da sua prole?” Sim, porque as decisões
que ela toma, desde a concepção, já dizem respeito à criação do próprio filho.
Os riscos que ela assume (seja escolhendo a cesárea ou o parto natural – ambos
com sua dose de perigo), são intrínsecos do poder familiar.
Se respeitamos a escolha de certos pais, que proíbem transfusão de sangue nos filhos, por motivos meramente religiosos, porque não respeitaríamos a mulher que deseja parir por cesárea?
Se respeitamos a escolha de certos pais, que proíbem transfusão de sangue nos filhos, por motivos meramente religiosos, porque não respeitaríamos a mulher que deseja parir por cesárea?
Sabemos que o Brasil é um país que
tende ao paternalismo, no sentido de decidir pelos cidadãos como eles devem
agir, em qualquer setor da vida. Decidem, por nós, que não somos capazes de
portar armas porque podemos ferir uns aos outros (enquanto isso, não conseguem
evitar que os bandidos as portem e matem o cidadão de bem, desprotegido);
decidem, por nós, que podemos sobreviver com “bolsa isso”, “bolsa aquilo” ao
invés de gerarem educação/emprego para que possamos ganhar o quanto quisermos
ou pudermos; decidem, por nós mulheres, que não podemos fazer cesárea porque
parto natural é melhor (baseado em estudos contraditórios e uma filosofia
mesquinha de economia que não se diz abertamente); decidem, por nós, que a
mulher que não deseja ter filho e teve a infelicidade de estourar a camisinha
na transa, agora não pode ter acesso à pílula do dia seguinte, porque isso é
aborto (baseado em filosofia religiosa altamente controversa, presente num
estado TEORICAMENTE LAICO).
Até quando vamos deixar que mandem em
nossas vidas, com intenções egoístas e até filosóficas das quais potencialmente
discordamos?
O art. 226, § 7º da Constituição
Federal diz que “Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da
paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal,
competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o
exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de
instituições oficiais ou privadas.”
Esse artigo, somente, seria suficiente
para impedir qualquer projeto de lei tendente a abolir o direito da mulher de
planejar seu próprio parto, da maneira como melhor lhe convier e, mais, sendo
DEVER do Estado propiciar os recursos científicos necessários para a realização
da cesárea, caso seja essa a opção da mulher.
Mulheres, vamos tomar as rédeas de
nossas vidas!
Não vamos deixar que a sociedade nos
oprima novamente, de maneira sórdida, fazendo com que acreditemos que a
opressão é para o nosso próprio bem!